Hoje, o movimento
se faz imperceptível.
os filhos estão mortos.
O povo, adormecido.
Não vem da rua aos teus ouvidos
nenhuma canção de ninar.
Dir-se-iam depostas todas as armas,
o gesto de fogo enfim dobrado,
Entre os combatentes
há quem já não reconheça o caminho.
Há quem interrogue, com tristeza,
a praça vazia.
Se nesta hora o inimigo te procura,
recusa o jantar que te oferece.
Recusa a paz,
a vida que te oferece.
O jantar te daria um assento à mesa da noite.
Esta paz é tua escravidão.
E se agora o inimigo te propõe a vida,
é chegada a hora de tua morte.
(Pedro Tierra, in Poemas do povo da noite, 1974.)
Este poema é dedicado ao companheiro Mário Alves, torturado até a morte em 16 de janeiro de 1971, que nos ensinou esta verdade.
[Poemas do povo da noite]. Os poemas de Pedro Tierra (Hamilton Pereira da Silva) foram escritos em centros de detenção e tortura (DOI-CODI e DOPS) e nos presídios que receberam prisioneiros políticos (Tiradentes, Carandiru, Barro Branco) nos piores anos e correram o país e outros países. Eram lidos e declamados em reuniões e atos dos movimentos pela Anistia e pela democracia.